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HOJE | STF pode mudar lei e liberar porte de droga de uso pessoal; entenda impactos da medida em sua vida

Corte volta a analisar ação na quarta e deve definir parâmetro; estudo do Ipea traça cenários

Quase oito anos depois, o Supremo Tribunal Federal (STF) deve voltar a debater na quarta-feira a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. O julgamento será reiniciado já com três votos defendendo a inconstitucionalidade do trecho da Lei de Drogas que trata sobre o assunto, mas com divergências entre eles sobre a forma de fazer isso.

Além da criminalização ou não do porte, o STF também pode definir uma maneira objetiva de diferenciar usuário e traficante. Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontou que um critério desse tipo poderia reclassificar entre 27% e 48% dos casos em que a apreensão de maconha levou a uma condenação por tráfico. Nas condenações envolvendo cocaína, esse número varia entre 31% e 37%, dependendo do parâmetro adotado.

A ação que está sendo julgada questiona a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, de 2006, que estabelece ser crime “adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.

Em 2015, o relator, Gilmar Mendes, votou para considerar inconstitucional o artigo, o que na prática descriminaliza o porte de drogas para uso pessoal. Gilmar defendeu manter as sanções previstas na lei para usuários, mas determinou que elas devem ter caráter apenas administrativo, e não penal.

Os dois ministros que votaram a seguir — Edson Fachin e Luís Roberto Barroso — votaram pela descriminalização do porte apenas da maconha, por ter sido essa a droga apreendida no caso em análise. Eles, no entanto, divergiram justamente sobre a adoção de um critério objetivo para diferenciar um usuário de um traficante.

Fachin propôs que essa quantidade deve ser definida pelo Legislativo. Já Barroso sugeriu um número: 25 gramas de maconha ou a plantação de até seis pés. Esse valor, no entanto, não seria um parâmetro rígido, e poderia ser reavaliado por cada juiz, que precisaria fundamentar sua decisão.

A análise foi interrompida pelo então ministro Teori Zavascki, morto em 2017. Por isso, o julgamento será retomado com o voto do seu substituto, Alexandre de Moraes.

 

Voto de Rosa

 

O processo divide opiniões entre ministros do Supremo, mas, hoje, a expectativa é que haja uma maioria de votos para a adoção da tese proposta por Gilmar Mendes. O principal ponto de divergência deve ficar por conta das formas de aplicação do entendimento adotado e de possíveis critérios fixados para a diferenciação entre usuários e traficantes — a aposta nos bastidores é que seja preciso chegar a um voto médio a respeito deste ponto.

Outra aposta feita por integrantes da Corte é que a presidente, ministra Rosa Weber, antecipe o seu voto mesmo que haja um pedido de vista por parte de um dos dois ministros indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, Nunes Marques e André Mendonça.

Com aposentadoria prevista para ocorrer em setembro, a ministra tem dado sinais de que pretende votar em temas que considera importantes, como é o caso dessa discussão. Não à toa, Rosa vem incluindo o recurso na pauta do plenário desde maio, e vem tentando dar seguimento ao julgamento. Por isso, mesmo que a análise venha a ser interrompida após o voto de Moraes, é possível que a ministra consiga dar o seu posicionamento antes de sair do tribunal.

 

Três cenários

 

A pesquisa do Ipea, divulgada neste ano, analisa os possíveis impactos de três parâmetros diferentes, sugeridos em uma nota técnica do Instituto Igarapé. O mais conservador é de 25 gramas de maconha (o mesmo sugerido por Barroso) e de 10 gramas de cocaína. Já o cenário menos conservador é de 100 gramas de maconha e 15 gramas de cocaína.

Responsável pela pesquisa do Ipea, Milena Soares afirma que o estabelecimento de um parâmetro impactaria todas as fases da investigação, não apenas a sentença.

— Se existisse um parâmetro objetivo, é esperado que não apenas o juiz aplique isso no momento da sentença, mas também o Ministério Público no momento de optar por apresentar a denúncia ou não, o delegado no momento do relatório ou até mesmo o policial que está no policiamento ostensivo.

O estudo foi feito a partir de uma amostra de 5.121 réus condenados de tráfico de drogas no primeiro semestre de 2019. Entretanto, o artigo ressalta que a reclassificação não seria automática e dependeria da análise de outros fatores.

O advogado Cristiano Maronna, diretor da plataforma Justa, afirma que, além dos critérios de diferenciação, o julgamento é uma oportunidade para o STF estabelecer um “standard probatório”, que seria uma série de elementos que caracterizariam o crime de tráfico. Para Maronna, autor de livro sobre a lei de drogas, isso criaria uma necessidade das investigações seriam aprimoradas.

— Mais importante do que isso (o critério) é a definição de um standard probatório necessário para a caracterização do crime de tráfico de drogas — afirma, explicando: — Exige que o órgão acusador comprove que a pessoa de fato é traficante, que ela se dedica ao tráfico, que a droga encontrada tem efetivamente destinação comercial. E não, como é hoje, com base em presunção. Teria que haver uma qualidade de investigação maior.

De acordo com o advogado, atualmente é o usuário que precisa provar que não é traficante, o que acaba levando a muitas condenações baseadas na cor da pele ou no local de moradia do réu.

— Isso cria na prática uma situação em que todos são tratados como traficantes e todos acabam tendo o ônus de provar que não são traficantes. E a questão se resolve muitas vezes na cor da pele, no CEP.

Redação GOYAZ

Redação: Telefone (62) 3093-8270

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